O canabidiol (CBD) virou assunto entre atletas profissionais e amadores visando saúde e performance. Porém seu uso só é indicado em casos específicos. Confira o que dizem os especialistas
Yara Achôa, Fitness Brasil
6/12/2022
Fora da lista de substâncias proibidas pela Agência Mundial Antidoping (WADA, na sigla em inglês) desde 2018, o canabidiol (CBD) – substância não psicoativa derivada da planta – é tema cada vez mais frequente nas rodas de conversas de atletas de alto rendimento. As Olimpíadas e Paralimpíadas de Tóquio, no ano passado, foram os primeiros eventos a liberarem sua utilização – e agora temos a Copa do Mundo.
No esporte ele surge como aliado para alívio de dores e inflamações, problemas articulares e ansiedade. Ainda há muito a ser estudado mas, aos poucos, pesquisadores avançam nas descobertas de seus benefícios. “O canabidiol pode ajudar atletas no sentindo de diminuir a ansiedade e, eventualmente, por meio de um fator anti-inflamatório e antiálgico, agir contra dores. Vale lembrar que é o uso do canabidiol isolado, sem tetrahidrocanabinol (THC)”, explica Renato Anghinah, Professor Livre Docente em Neurologia da Universidade de São Paulo (USP) e Chief Medical Officer (CMO) da HempMeds.
Triatleta amador há mais de 20 anos, Fernando Paternostro entende bem sobre esforço físico e superação – e também sobre desconforto, dores e lesões. Ele começou a experimentar o uso de cannabis no esporte em 2019. “Eu fazia uso de anti-inflamatórios, suplementos. Gastava com essas soluções e não via grandes melhoras. Resolvi migrar de alopatia para cannabis. Foi um teste que quis fazer, com supervisão médica, acompanhado por equipe multidisciplinar. Hoje só uso cannabis. Entre os benefícios, aponto a diminuição do processo inflamatório do corpo e, indiretamente, melhora da performance. Isso porque a substância modula o sistema endocanabinoide, trazendo mais qualidade de sono e melhor recuperação muscular, me deixando mais disposto para treinar”, explica.
O entusiasmo com o uso de CBD foi tanto que, além de passar a compartilhar suas experiências pelas redes sociais, Paternostro montou uma plataforma de conteúdo e serviços – a Atleta Cannabis – e o aplicativo myGrazz. “Desde a pandemia percebi as pessoas mais preocupadas com a saúde e com maior interesse por tratamentos naturais – e a cannabis é um fitoterápico. Passei também a receber muitos questionamentos sobre o tema e então parti para criação do app, que está em fase de lançamento. Nosso principal trabalho é levar informação. O myGrazz é o primeiro hub de cannabis medicinal do Brasil. Uma plataforma mobile capaz de atender todas as demandas daqueles que querem se tornar pacientes de cannabis. Também temos um trabalho de capacitação de médicos – são 500 mil CRMs ativos e por volta de 2500 que prescrevem CBD.”
É importante dizer que quem decide pela indicação sempre é o médico. “Sou neurologista e posso prescrever legalmente o uso da cannabis. Mas não faço logo de cara. Analiso o histórico do paciente, estudo e vejo a necessidade – ou não – da prescrição. Esse produtos não são panaceia”, diz Renato Anghinah.
Regulamentação do CBD no esporte
Segundo a Escola de Educação Permanente, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (EEP HCFMUSP), o uso do CBD é estudado há anos. Mas a partir dos anos 1980/ 1990 trabalhos sobre a aplicação do ativo passaram a ganhar força para o uso terapêutico, tendo ainda mais relevância depois de 2010. O primeiro produto com fins medicinais no Brasil apareceu em 2014. Em 2015, a cannabis medicinal passou a ser indicada para tratamento de epilepsia refratária e, em seguida, para pacientes com transtorno do espectro autista (TEA). Com o passar do tempo, surgiram outras evidências científicas na aplicação para ansiedade, dores crônicas e neuropáticas, e sono – condições comuns que afetam os atletas de alta performance, por exemplo.
Em contrapartida, o corticoide, que sempre foi utilizado por esportistas, passou a ser cada vez mais restrito, até ficar proibido para atletas profissionais – e foram substituídos por produtos derivados da cannabis, por não interferirem no desempenho.
Verdadeiro ou falso
Pioneira no serviço multidisciplinar integrado de saúde do atleta, a Care Club se uniu há um ano com a Tegra Pharma, farmacêutica brasileira dedicada aos usos terapêuticos da cannabis medicinal, para trabalhar na mudança de paradigmas, ajudando na desmistificação do tema e experimentando efeitos positivos no tratamento de inflamações, ansiedade, sono e outros. Inclusive, as empresas apoiam uma pesquisa clínica liderada pelo otorrinolaringologista Roberto Beck – Doutor em Ciências pela FMUSP e integrante do corpo clínico da Care Club –, com atletas cannabis, cujo objetivo é montar um protocolo para esportistas e implementar um programa de tratamento canabinoide.
Em recente plenária realizada na unidade Villa Lobos, em São Paulo, com participação de Raphael Camargo, diretor de Marketing da Care Club; Jaime Ozi, vice-presidente do Grupo OnixCann; Ana Gabriela Baptista, fisioterapeuta, especializada em canabinoides, diretora de Produtos da Tegra Pharma e perita judicial em cannabis medicinal, Roberto Beck apontou verdades e mitos sobre o tema. Confira!
CBD é droga – Falso. Desde 2015, a Anvisa permite o acesso legal a produtos à base da cannabis medicinal no Brasil. A produção e fabricação ainda são proibidos. Os produtos são importados e/ ou finalizados no país. E só são vendidos com prescrição médica. Além do CBD, há outros canabinoides, como THC, CBN, CBG; e também terpenos (responsáveis pelo cheiro), flavonoides (responsável pela cor e sabor), entre outros.
Cannabis é doping – Verdadeiro. Até 2018, qualquer medicamento a partir de cannabis era considerado doping pela WADA. Desde então, a agência tirou da lista apenas o CBD isolado. O uso recreativo da cannabis e medicamentos com outros canabinoides são considerados doping. No entanto, em 22 de setembro de 2022, a WADA publicou uma revisão, aumentando a tolerância de THC (tetrahydrocannabinol), em fase de competição, de 15 microgramas por milímetro de urina para 150 microgramas, mesmo sem existir comprovação científica que o THC melhore a performance dos atletas. A regra se dá para manter o “espírito olímpico”. “Os benefícios da utilização da cannabis medicinal são indiretos, com menos dor e dormindo melhor o atleta, consequentemente, terá um sistema imunológico melhor, ficará menos doente e a performance melhorará. Estará em equilíbrio”, destaca Beck.
CBD tem efeito psicotrópico – Falso. Quando usada recreativamente por adultos, a maconha, por causa do THC, altera a consciência, promovendo a euforia. Mas isso não ocorre na forma de medicamento.
CBD dá sono – Verdadeiro. Uma das indicações do CBD é o tratamento da insônia, a depender da dose e tipo de fitocanabinóide utilizado.
CBD pode ser encontrado em diversas apresentações – Verdadeiro. Os produtos derivados de cannabis podem ser em forma de gotas (óleo), roll on (dor muscular ou articular), loção (superfícies lesionadas) e cápsulas.
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